Conselheiro crê que Jogos 2016 serão os mais limpos da história

Conselheiro da USADA / Foto: Luiz Roberto Magalhães

Rio de Janeiro - A luta contra a dopagem no esporte é travada em várias frentes. Uma das principais é a difusão de informação, de modo que atletas, técnicos e outros profissionais envolvidos em atividades esportivas possam conhecer os riscos do uso de substâncias e métodos proibidos e, assim, as competições possam ser mais limpas.
 
Entretanto, as campanhas educativas e os testes antidopagem realizados dentro e fora das áreas de competição não são os únicos pilares dos trabalhos a que a Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem (ABCD) se dedica. É preciso, também, identificar e punir aqueles que produzem e distribuem substâncias ou métodos proibidos. E é aí que os trabalhos de inteligência se tornam fundamentais.
 
Realizado em Brasília, o I Fórum ABCD de Inteligência Antidopagem reuniu representantes de diversas organizações nacionais e internacionais que atuam no setor de inteligência. Estiveram presentes, além de profissionais de entidades brasileiras, como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), convidados ligados à Agência Antidopagem dos Estados Unidos (Usada), à U.S. Homeland Security, à Polícia Judiciária de Portugal, à Guarda Civil Espanhola, à Agência Antidopagem da China (Chinada), à Agência Antidopagem do Reino Unido (UKDA) e ao Centro Canadense pela Ética no Esporte (CCES, em inglês), além do Comitê Olímpico Internacional (COI).
 
O evento discutiu e apresentou diversos casos bem-sucedidos de operações que culminaram no desbaratamento de grupos ou indivíduos que trabalhavam na produção e distribuição de substâncias ou métodos proibidos no esporte.
 
Um dos palestrantes, William Bock, da Usada, falou sobre um dos casos mais importantes da história das operações antidopagem, que envolveu, entre outros, o ex-ciclista Lance Armstrong. Sete vezes campeão da Volta da França e um dos atletas mais famosos do mundo na década passada, Lance perdeu todos os títulos da Volta da França (competição mais importante do mundo no ciclismo de estrada) e foi banido do esporte depois que as investigações provaram que ele participou, por anos, de esquema sistemático de dopagem em sua equipe. Ao fim do processo de investigação, Lance, que por anos havia negado o uso de substâncias e métodos ilegais, confessou ter se dopado em uma entrevista à apresentadora americana Oprah Winfrey.
 
“O que o caso Armstrong fez foi demonstrar para muita gente do esporte e das entidades antidopagem a importância da investigação, que é um dos tópicos que viemos discutir aqui no Brasil”, explicou Bock, um dos conselheiros da Usada. “Acredito que esse caso mostrou a toda a comunidade que atua no campo da antidopagem a necessidade de não se atacar a dopagem apenas através da educação ou da ciência, com os testes. É preciso também combinar esses fatores com um terceiro, que é a inteligência, as investigações”.
 
William Bock destacou a importância da colaboração de diversos agentes no caso Armstrong e como o impacto refletiu na maneira de as pessoas encararem o assunto. “Algumas evidências do caso Armstrong foram obtidas através de cooperações com instituições policiais de outros países. Portanto, houve um aspecto de cooperação global. Obviamente, Lance Armstrong era um dos atletas mais conhecidos do planeta e o fato de que ele tinha conseguido se dopar com sucesso e por um longo período surpreendeu muita gente. Então, o caso teve notoriedade. E isso forçou as pessoas a se defrontarem com questões do tipo: como ele conseguiu fazer isso por tanto tempo? Como ele eventualmente foi descoberto? O que isso significou para o futuro do sistema? Esse caso foi um ótimo aprendizado e abriu a mente das pessoas para o fato de que a gente precisa desse terceiro componente, que é a inteligência, nas ações antidopagem”.
 
Em seu livro, lançado no Brasil sob o título “A Corrida Secreta de Lance Armstrong – Nos bastidores do Tour de France: Doping, armações e tudo o que for preciso para vencer”, o ex-ciclista profissional dos Estados Unidos Tyler Hamilton – que integrou a equipe US Postal Service, de Lance Armstrong, e foi campeão olímpico de contrarrelógio em Atenas 2004 – narrou com detalhes como funcionava o esquema profissional de dopagem não só em sua equipe, mas em praticamente todos os times de ponta do ciclismo de estrada que competiram na Volta da França e em outras competições relevantes da modalidade.
 
As revelações de Hamilton, que perdeu seus títulos, devolveu a medalha de ouro olímpica e foi banido do esporte, tiveram importância crucial no desfecho do caso Armstrong. Mas também atingiram em cheio a credibilidade do ciclismo profissional por escancarar a maneira inadequada como o esporte era conduzido.
 
“O ciclismo é um dos esportes que chamamos de alto risco, porque existe um grande benefício que pode ser obtido através da dopagem”, ressaltou William Bock. “Além disso, é um esporte no qual existe uma clara razão econômica para se dopar. Esses fatores combinados são tentadores. Aí, você combina isso com a situação de dentro do ciclismo, que é a que a UCI (Federação Internacional de Ciclismo) agora está conseguindo reverter ao conduzir investigações, e você tem a ‘tempestade perfeita’ para uma forte cultura de dopagem dentro do esporte”.
 
Indagado se em outros esportes existem esquemas de dopagem tão profissionais quando o operado no ciclismo na década passada, Bock explicou que é preciso estar atento a aspectos que colocam determinadas modalidades mais em evidência do que as outras.
 
“Quando você observa os esportes e tenta descobrir quais os que têm mais chances de dopagem, você deve olhar alguns fatores. Um é se existe muito dinheiro envolvido. Isso vai criar incentivos para a dopagem. O segundo é observar quais as qualidades físicas são atribuídas a esse esporte. Se ele é de resistência, então EPO (hormônio proibido Eritropoietina) ou dopagem de sangue podem ser problemas. Se ele é de força ou velocidade, temos de estar atentos aos esteróides. Mas também existe um terceiro fator, que é o quão efetivamente esse esporte está tentando se previnir contra a dopagem. Você pode ter um esporte que tem altas chances de dopagem e ter baixas taxas (de casos positivos) caso as entidades envolvidas façam um bom trabalho e as pessoas acreditem que vão ser apanhadas. Então, temos uma boa ideia sobre quais esportes têm as maiores chances de dopagem e tentamos concentrar nossos recursos para testar esses atletas e conduzir investigações nesses esportes”, disse.
 
Bock aproveitou para elogiar a atitude de Tyler Hamilton e a importância que suas revelações tiveram em prol de um esporte mais limpo. “Não é fácil confrontar os erros feitos no passado. É preciso caráter para fazer isso. E ao fazer isso, ao falar claramente sobre sua própria dopagem e sobre o esquema na US Postal Service Team, acho que Tyler deixou um grande legado. Ao estar disposto a sair pelo mundo e falar com os atleta mais jovens sobre o quão importante é dizer a verdade e competir limpo, ele presta um enorme serviço”.
 
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